segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Exercício da não-curiosidade

A curiosidade é o interesse em conhecer algo novo, descobrir informações fora do repertório já sabido. Por isso hoje, decidi exercitar a minha não-curiosidade. Aliás, hoje é um excelente dia para isso.
O Brasil inteiro (cerca de 135 milhões de eleitores aptos a votar) espera com não pouca ansiedade o resultado das eleições presidenciais de 2010. Será o ano em que elegeremos a primeira mulher presidente do país? Não importa. Aliás, isso pouco importa neste momento de tentativas literárias, diga-se de passagem. Agora a questão é: já são sete da noite, daqui a mais ou menos três horas já podemos saber o resultado parcial, segundo o Tribunal Superior Eleitoral, o que mesmo assim não afetará a equação final. E eu vou me segurar. Essa é a proposta.
Ousadia para uma jornalista. Como qualquer um da área, somos formados para escarafunchar a vida, o mundo, o fundo, a lama, o brilho, o escuro e transformar o que não aparece, em notícia. Difícil para uma curiosa nata.  Mas eu vou tentar. São essas possibilidades de quebra da normalidade que insights generosos sobem à tona de profundezas sombrias. Experimente!
Hoje é o meu dia do exercício da democracia imposta (alguma semelhança com o processo de sufrágio terá sido mera coincidência?), da ditadura à vontade – se conseguirei aguentar, não sei. Mas amanhã de manhã cedinho, no jornal que apresento em rádio FM, darei a notícia em primeira mão para mim mesma. Assim como quando passei em pedagogia em Santa Catarina – meu primeiro curso de graduação – eu mesma li no ar meu nome no listão – tão esperado por neófitos no mundo universitário. Emoção no mínimo curiosa que vivi.
Agora é contagem regressiva. Não para o resultado das eleições, mas para saber se darei conta. O que pesa a meu favor? Um texto de Freud, hermético, claro – desculpe o trocadilho infame – que precisa ser lido até amanhã e, um vento primaveril que torna minha corrida habitual irritadiça por conta do friozinho que se faz presente.
Desafio a mim mesma a segurar a onda e não buscar informação nenhuma – nada de Internet, televisão, rádio, telefone, vizinho, sinal de fumaça em azul ou vermelho...Certo que ouvirei espocos de fogos de artifício, mas há algum código para eu decifrar e saber de quem se trata a comemoração?
E nesse desafio da não-curiosidade está a própria curiosidade. Conseguirei?
Ora, pra quê isso, pergunta um internauta lendo esse texto depois de já passado o resultado – do desafio e das eleições – e pra ele tudo esclarecido. Resposta: Brincadeira comigo, desafio de criança, bobagem, pura distração, neuróbica (ginástica dos neurônios), sei lá. Às vezes a vontade é a de desafiar o óbvio.
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Dia seguinte, sete da manhã, sobrevivi. A não-curiosidade dormiu de olho aberto vencendo as apostas, bolões e pesquisas. 

domingo, 10 de outubro de 2010

Esperanza espera

Foto: Laura Capriglione/Folhapress

Tenho pensado muito nos mineiros do Chile a quase 700 metros de profundidade da superfície da terra. Mais de dois meses... Você consegue imaginar como é isso? Acompanho o drama das famílias e as necessidades que os mineiros apresentam por meio de papeizinhos ou de cartas enviadas às famílias. Um deles pediu como regalo uma foto do Sol. Que demais! Que deleite para quem não vê a luz do dia há semanas!

Esses homens, no total 32 chilenos e um boliviano, parecem ter saído de uma história de Gabriel García Márquez. Assim como um portal 3D direto para os personagens de Macondo, por exemplo. Ou como o sugestivo título que acabo de inventar: “A incrível e impressionante história de 33 homens no fundo da terra”. Provavelmente, em algum tempo, serão entrevistados e a história vai virar estória: livro, filme, minissérie de televisão.

O circo está armado, o enredo pronto com direito a um suspense do diretor geral (no caso, Deus), o cenário ainda recebendo os últimos retoques. Os figurantes todos a postos no lado de fora do imenso buraco escavado com potentes máquinas e brocas. Os atores principais ainda meio sem saber como tudo irá se dar no grand finale.

E do lado de cá ou de lá das imensidões oceânicas, preces, vibrações, bate-papos entre amigos. Que a vida não seja mais a mesma para eles, ou para nós, depois da resolução dessa tragédia anunciada. Aliás, o que são as minas de exploração de minérios e outras riquezas das entranhas da terra senão minas a ponto de explodir com a vida que se arrisca por míseros salários? Em troca, mineradoras e empresários, engordam as contas bancárias; em troca, a natureza devassada, devastada, chora.

O acampamento Esperanza espera, os homens esperam, o mundo espera.

Como seria se estivéssemos lá, no lugar de um dos 33?

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Adriane Lorenzon aderindo ao Facebook

Gente, tantas ferramentas à disposição no mundo virtual - que já é real.
Não tenho tanto tempo para atualizar informações nem uma equipe formada para tal procedimento.
Mas acabo de me filiar ao facebook e ao twitter.
Adriane Lorenzon

Criar seu atalho
Meu perfil no twitter é o @adrianelorenzon

sábado, 11 de setembro de 2010

Veja e seus equívocos

Não é de hoje que o leitor atento ao mundo que o cerca, observa que há periódicos, autores, jornalistas, professores, livros, diretores de cinema etc, equivocados na maneira de se expressar. Imagino que por conta mesmo do nível intelectual e moral de cada um. Isso vai diminuindo conforme vamos nos aprimorando como seres perfectíveis que somos.


A revista Veja tem em seu histórico um portfólio de equívocos grosseiros. Só para lembrar a matéria sobre Cazuza nos anos de 1990 e, agora, mais recentemente, a reportagem sobre o filme Nosso Lar. Há profissionais (?) como Diogo Mainardi que durante muito tempo (e não posso afirmar que ainda o é, pois há muito tempo nem folheio a revista Veja) que se deliciam com uma vontade extraordinária, digamos assim, ácida e pré-julgadora de pessoas e fatos, acima do bem e do mal. Será essa revista e seus empregados da redação representantes do tão propalado Quarto Poder?


"Hay que endurecerse pero sin perder la ternura jamás" (C. Guevara).


O filme Nosso Lar estreou no último dia 3 de setembro e, incrivelmente, bateu o recorde de bilheteria nacional de filmes como  "Se eu fosse você 2", de Daniel Filho. Em outro post vou falar de Nosso Lar, ok?


Acompanhe a carta de Richard Simonetti, um dos principais autores estudiosos do Espiritismo brasileiro, enviada à redação de Veja. Esse mesmo autor, já fez o mesmo à redação da revista Superinteressante, em outro assunto e contexto.


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Richard Simonetti lamenta em carta à revista Veja:

(foto: www.centroespiritafxs.com.br)


Carta para a revista VEJA 1 de setembro de 2010

Senhor redator.

Como espírita, assinante dessa revista há muitos anos, lamento o
tom de deboche que caracterizou sua reportagem sobre o filme Nosso Lar,
o que, diga-se de passagem, também está presente em matérias sobre
outras religiões. Nesse aspecto, VEJA é uma revista coerentemente
debochada. Não respeita a crença de nenhum leitor.

Pior são os erros de apreciação sobre a Doutrina Espírita, revelando
ignorância do repórter, uma falha perigosa, porquanto coloca em
dúvida outras matérias e informações. Como saber se os responsáveis
estavam preparados para escrevê-las, evitando fantasias e
especulações?

Para sua apreciação, senhor redator, algumas “escorregadelas”
do repórter:

a) Grafa entre aspas o verbo desencarnar. Só teria sentido se ainda
não houvesse sido dicionarizado. Por outro lado, noventa por cento
dos brasileiros são espiritualistas, isto é, acreditam na existência e
sobrevivência do Espírito. Este ser imortal desencarna, jamais morre.
A minoria materialista, que acredita que tudo termina no túmulo,
certamente terá surpresas quando “morrer”.

b) Fala em cordilheira de ectoplasma onde se situaria Nosso Lar.
De onde tirou isso? Ectoplasma é um fluido exteriorizado pelos
médiuns para trabalhos de materialização. Os físicos, esses visionários
cujas “fantasias” acabam confirmadas pela Ciência, falam hoje que há
universos paralelos, que se interpenetram, semelhantes ao nosso. A partir
daí, não é difícil imaginar o mundo espiritual descrito por André Luiz
como parte de um universo paralelo com seres e coisas semelhantes à
Terra, feitos de matéria num outro estado de vibração, não um mundo “ectoplasmático”, mas de quintaessência material. Nada de se admirar,
portanto, que em cidades desse mundo existam pessoas com “uma rotina
parecida com a dos vivos: comem, bebem, trabalham e moram em casas
modestas ou melhorzinhas”. Espirituoso esse “melhorzinhas”. Imagina
o repórter que o Espírito é uma fumaça sem forma, sem consistência,
habitando um nada?

c) Situa o aeróbus, um transporte coletivo que voa, como algo improvável.
Menos mal que não tenha escrito impossível. De qualquer forma, ignora,
certamente, que pesquisadores estão aperfeiçoando veículos dessa natureza,
em alguns países, como solução para os problemas de trânsito e que
no universo paralelo, o mundo espiritual, de matéria quintaessenciada, é muito
mais fácil resolver problemas relacionados com a gravidade. Ou,
imagina que tudo flutua por lá?

d) Diz jocosamente que “o visual da colônia dos espíritos de luz
comprova: o brasileiro pode até se livrar do inferno, mas não escapa
nem morto da arquitetura de Oscar Niemeyer. A cidade fantasmática de
Nosso Lar é a cara de Brasília…” Não se deu ao trabalho de comparar
datas e não percebeu que, mais apropriadamente, Brasília copiou
Nosso Lar, visto que a cidade espiritual foi descrita por André Luiz em
1943, enquanto a construção de Brasília foi planejada e ocorreu no
governo de Juscelino Kubistchek, de 1956 a 1961, inaugurada em 1960.

Quanto ao mais, seria recomendável aos repórteres da VEJA o benefício
de um estudo acurado e sem prejulgamento do livro que deu origem ao
filme, psicografado por esse atestado vivo de integridade e amor à verdade,
que foi o médium Chico Xavier, para compreenderem qual é o objetivo
dessa magistral obra, como resume o Espírito Emmanuel, no prefácio:

André Luiz vem contar a você, leitor amigo, que a maior surpresa da
morte carnal é a de nos colocar face a face com a própria consciência,
onde edificamos o céu, estacionamos no purgatório ou nos precipitamos
no abismo infernal; vem lembrar que a Terra é oficina sagrada, e que
ninguém a menosprezará, sem conhecer o preço do terrível engano
a que submeteu o próprio coração.

Richard Simonetti
www.richardsimonetti.com.br

sábado, 17 de julho de 2010

Dia da proteção às florestas

Foto: Adriane Lorenzon (araucária - RS)

Hoje, 17 de julho, é o dia da proteção às florestas.
Um dia de reflexão e de atitude. E eu cá confabulando com meus botões, nesse dia chuvoso de inverno, lembrei dos instantes e horas maravilhosos que passei dentro das florestas que já tive a oportunidade de adentrar.
É uma sensação indescritível. Experimente!
Quem sabe assim, saberá do valor das árvores e quem sabe, você possa se tornar um guardião de florestas.
Isso mesmo, que tal todos nos tornarmos, nem que seja, por um dia, caiporas das florestas? Sim, curupiras atentos às arvores nossas do dia a dia! Cuidadores amorosos dessas benfazejas amigas!
Protegendo as árvores, irmãs-amigas, cuidaremos também e melhor de nós mesmos.
Paz e bem!

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Morte morrida... ressurgindo das cinzas

Queridos amigos e visitantes ocasionais,
escrevo um recado para dizer que dei uma sumida para me refazer...
agora, já renovada, estou de volta à ativa e, em breve, postarei meus textos novamente.
Não podia deixar de fazer a ponte com o poetinha do Majestik aí no último post, que fala exatamente da morte. Afinal, sou de escorpião, e nós, seres dos monturos e porões,
estamos acostumados a mergulhar na escuridão de vez em quando para recobrar a energia, o vigor.
Nessas horas, Plutão me auxilia com seu darkside.
Ah, aos desavisados, não estive doente, foi só uma morridinha mesmo, para breve retorno.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Mario Quintana

Libertação

A morte é a libertação total: A morte é quando a gente pode, afinal, estar deitado de sapato.

Mario Quintana

Homenagem do drilorenparamaiores.blogspot.com pelo aniversário de morte (+ 5/5/1994)
do nosso poetinha dos pampas: Mario Quintana.
Alguns versos:
Da recordação
A recordação é uma cadeira de balanço embalando sozinha.
As viagens
O mais confortador das viagens são esses burrinhos pensativos que vemos à beira da estrada
e nos poupam assim o trabalho de pensar.
Conto de horror
E um dia os homens descobriram que esses discos
voadores estavam observando apenas a vida dos insetos...
Hai-kai
No meio da ossaria
Uma caveira piscava-me
Havia um vagalume dentro dela.
Elegia urbana
Rádios. Tevês.
Gollllllllllllllllllllllllllo!
(O domingo é um cachorro escondido debaixo da cama).

terça-feira, 4 de maio de 2010

Noel Rosa

Noel Rosa morreu em 4/5/1937. Lá se vão 63 anos, completados hoje, sem aquele que é considerado um dos nossos maiores músicos. Aqui, uma provinha do que foi capaz de compor.
Abaixo, o vídeo de Maysa e Rildo Hora. Sinta o que três gênios da nossa música, o gaitista ainda vive no Rio de Janeiro, fazem com esse clássico da boa música brasileira. Lirismo, maestria e sensibilidade.

sábado, 1 de maio de 2010

Frase do dia

"Os homens semeiam na Terra o que colherão na vida espiritual: os frutos da sua coragem ou da sua fraqueza".(Allan Kardec)
Foto: autoria desconhecida || Fonte: amostra de imagens windows

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Respeito: eu sei que ele existe

Em 1999 vivi a alegria de assistir a uma palestra proferida por Dalai Lama, em Brasília. Alegria por vários motivos, já que eu morava há pouco tempo na capital federal e, descobria a cada dia novas possibilidades de filosofias, religiões, seitas, teorias – cada uma a seu modo propagando a paz, o amor. Brasília, pra se ter uma ideia, é uma das cidades do mundo que possui mais templos em seu território.

Diversas autoridades estiveram presentes numa tenda branca montada na Universidade de Brasília, como o rabino Henry Sobel, o indígena Marcos Terena, e representantes do candomblé, da igreja presbiteriana, da Universidade de São Paulo, entre outros.

Dalai Lama, um poço de paciência, falou calmamente sobre a paz, que ele não quer impor o budismo às pessoas, que respeita as demais religiões, tratou também da importância do mundo espiritual e não somente do material. Diversas vezes fora interrompido pela aclamação do público, com palmas e vivas pelo tanto de sábio que havia em suas palavras.

Contudo, o mais intrigante e que me afetou na época, passo a narrar agora:

Dalai Lama, líder espiritual do Tibet (localizado ao sudoeste da China e que luta por sua independência desde o início da década de 1950), se comunica não no dialeto nativo, mas em inglês. Assim viaja o mundo proferindo palestras, encontros, reuniões seja com líderes e autoridades ou com pessoas simples do povo. Desse modo consegue se comunicar com o mundo.

Como ocorre em diversos países por onde passa, Dalai Lama se expressa em inglês e, em seguida, um tradutor translada para a língua oficial do país em que se encontra – no nosso caso de 1999, em português.

Isso, só para contextualizá-lo, caro leitor...

Assim, imagine você a cena: Dalai Lama falando em inglês (a plateia que dominava a língua inglesa batia palmas e expressava sua compreensão imediatamente, antes de o tradutor realizar seu serviço – tudo certo, tudo natural até aqui), então vinham as tais palmas, em seguida o tradutor interpretava o discurso e, a seguir, o óbvio: pessoas que dominavam apenas o português bateriam palmas e expressariam com vivas e outras demonstrações gestuais e faladas sua compreensão assim como o primeiro grupo o fizera. Certo?

Não, necessariamente. Ocorreu aí um triste caso de desrespeito. Observe como para nos melhorarmos é necessário afinco, trabalho, muita dedicação. A fronteira para amanhã sermos melhores do que hoje é muito sutil.

As mesmas pessoas que expressavam olhares, gestos e falas de alegria e simpatia às palavras de amor, paz e justiça proferidas pelo ilustre mestre tibetano, no primeiro momento após a fala em inglês dele, em vez de considerarem o timing necessário para a outra parte da plateia também compreender a mensagem, pediam, ou melhor, exigiam silêncio, fazendo psssssssssssiit [sabe aquele barulhinho onomatopaico, que mescla p e um som chiado?].

Aquilo virou um barulho só. Junte o ruído de uns pedindo silêncio e outros com mãos festivas batendo-as incontinente. Parece algo com uma palestra de Dalai Lama?

Eu não precisaria considerar, mas não me aguento, vou revelar. Essas mesmas pessoas não eram indivíduos sem estudo, sem bagagem intelectual, muitas aprenderam inglês fazendo intercâmbios, viajando o mundo. Portanto, seres com pretenso discernimento da diplomacia que essas ocasiões exigem.

O evento ocorreu diversas vezes durante o discurso de Dalai Lama. Esses homens e mulheres teriam entendido o sentido mais simples da visita do convidado estrangeiro ao nosso país? Teriam sacado qual a real do discurso proferido em nome da paz? Teriam percebido o que vieram aprender ali? (Adriane Lorenzon)

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Nós animais insatisfeitos

O que você quer para a sua vida? Como a avalia até agora? O que acha que pode ou não fazer para melhorar e mudar a sua vida? Precisa mudar? Essas perguntas certamente não são comuns nas rodas de amigos, nos bares, nos bate-papos das vizinhas, nas fofocas que se ouve por aí. Imagine a cena, alguém dizendo: “– Fulana, ficou sabendo do novo projeto de vida da beltrana? Pois é, ela resolveu ser feliz, quer amar mais, vai ajudar mais o próximo, passou a se alimentar de modo saudável. Nossa, como ela está melhorando de vida! Como ela está evoluindo espiritualmente”!

Avaliar, analisar e refletir sobre a vida pessoal é algo que não nos ensinaram, seja na escola, na família, na igreja, no clube, muito menos pelos meios de comunicação. E, sendo assim, parece que é algo que não precisa existir, que não precisa fazer parte da vida de cada um. Eventualmente, quem tem acesso à arte e à filosofia e gosta de estudar esses temas pode assim ter contato com aquilo que transcende aos olhos, com o que mora mais longe, com o que está mais fundo do nível do mar. As regiões abissais são cheias de vida, embora a luz não se faça presente.

Geralmente, o questionamento e a inquietude ficam adormecidos até o dia em que algo nos desperte do cômodo conforto que buscamos ao longo dos dias. Nesses casos, entramos em parafuso, perguntamos o porquê de o nosso mundo estar desabando, nada nos consola ou se explica porque não há respostas imediatas para malresolvidos acúmulos gestados há largo tempo. Por que esperar chegar ao fundo do poço para buscar saídas? Talvez seja mais sábio trocar o tipo da pergunta e passar de por que isso ou aquilo, para para que isso está acontecendo comigo? Como ocorreu tal coisa comigo? Em que circunstância? Creia, muda-se o foco e o modo de se ver uma problemática e de solucioná-la também. Isso nos leva à reflexão automaticamente.

Ao encontrar um amigo que não se vê há muitos anos, o que seria contado a ele? Quais aspectos, qual enredo permearia o diálogo? O que você teria de interessante e nobre para resumir sobre a sua história? Acaso problemas, murmúrios e frustrações dariam a tônica da narrativa? Ou tendo experimentado a ousadia de querer uma vida melhor, teria aprendizados diversos, mesmo que tristes ou quiçá os alegres, para compartilhar?

Nesses tempos de comemoração e homenagem ao centenário de Chico Xavier, o Brasil traz à tona uma frase atribuída ao médium mineiro: “Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo, qualquer um pode começar agora e fazer um novo fim”. Pois, quando invertemos a lógica de visualizar nossos problemas, desafios e limitações, passamos a criar coragem e discernimento para encarar frente a frente a razão e descobrirmos resoluções para os incômodos e dificuldades que nos impedem de voar mais alto.

Então, fica uma pergunta indigesta, que dói o estômago, deixa a cabeça zonza e a fala encontra argumentos diversos para disfarçar. E de agora em diante, como quero seguir? Como planejar esse novo fim que me move no impulso dos dias e na irremediável trajetória que tenho a trilhar? Se errei, sofri, voltei ao erro, o que fazer para elencar metas plausíveis de serem realizadas, na pauta de meu projeto pessoal, tendo como princípios a decência, o amor, a fraternidade? Como me desenrolar do emaranhado de problemas e confusões no labirinto da vida?

Olhar para trás, encarar a razão, analisar as lições de cada acontecimento é um bom começo. Afinal, estamos aqui para evoluir. Carregamos o germe do que nos impulsiona ao progresso, ao melhoramento. Quando não nos foi dito que refletir mais profundamente, analisar a vida de modo holístico, contestar verdades amorosamente, não são tarefas prioritárias de cada ser no mundo, também não nos disseram que tínhamos total condição a priori de optar, usando nossa consciência, a aceitar isso como verdade. Temos poder decisório nisso tudo.

Desse modo, é possível recomeçar sempre. A síndrome de Gabriela (Gabriela, música de Dorival Caymmi eternizada na voz de Gal Costa) não precisa estar presente o tempo todo de todo o tempo que temos. “Eu nasci assim, eu cresci assim, eu sou sempre assim” e... posso alterar essa formação daqui pra frente. Não preciso morrer como sempre fui. Ou seja, EU QUERO que a minha vida seja sustentada por pilares construídos por mim e não pelos outros – por valores alheios ao meu entendimento do que seja um mundo melhor. Perceba que a harmonia do universo é o resultado da soma de harmonias individuais. Só a paz que nos invade nos momentos de deleite e regozijo nos dá a sustentação e o ânimo necessários para a labuta dos momentos difíceis.

Realizar a tão propalada reforma íntima, expulsar os irmãos gêmeos egoísmo e orgulho do coração, tomar atitudes benfazejas de deixar rastros de amor não são tarefas fáceis. Promover o automelhoramento dá trabalho, sim! E quem quer pagar o preço? Todo bônus tem uma contrapartida, um esforço. São tantas medidas emergenciais a serem tomadas: entender que temos responsabilidade sobre nossas escolhas e que nossa consciência possui gravadas as opções de retidão do caminho, desenvolver a compaixão, aparar as arestas com a família – nossa base de apoio em que estão nossos maiores desafios de reconciliação –, e entender de uma vez por todas que fazer o bem não é simplesmente não fazer o mal.

Talvez você considere mais cômodo encontrar alternativas equivocadas de justificativa como afirmar que agora não é hora, que agora precisa trabalhar, agora seu filho ainda é pequeno, agora você não está aposentado; para uns porque são velhos demais, para outros porque são jovens demais. Todos se desculpando para não promover a fantástica viagem da “iluminação interior”, como bem nos lembra Divaldo Franco. Tem até quem ouse dizer, com toda a arrogância e ignorância peculiares dessas situações, que está bem assim, que nada há para alterar. Afirma-se, ingenuamente: “Se melhorar estraga”! Estar satisfeito gera um conforto que mascara o que poderia ser melhor, o que poderia ser diferente. Há uma frase de Guimarães Rosa: “O animal satisfeito dorme”. O que aconteceria com a humanidade plenamente satisfeita?

Prioridades baseadas no raciocínio, na reflexão podem nos levar a um dia a dia que nos fortalece nessa jornada. Quais requisitos devem prevalecer na nossa lista pessoal de opções desse ponto em diante? O comodismo nos paralisa, nos convence de que algo não está bem, mas poderia estar pior, então está bom assim. Constate se realmente você quer melhorar algo. Se a resposta for sim, porque o não aqui não nos interessa, diga esse sim em novas atitudes, renove o seu agir no mundo, amplie os horizontes buscando possibilidades. As novas escolhas virão consequentemente. Não há necessidade de esperar um acidente de carro, a perda de um ente querido ou do emprego, a amputação de uma perna, uma separação, para perceber que algo precisa receber mais atenção por você.

A cooperação entre as pessoas não é algo para amanhã, para outros povos, para outra vida. Se nos juntarmos em voz uníssona, respeitando os diversos timbres, em busca da melhoria interior de cada um, estaremos viajando em uma velocidade maior rumo ao desconhecido regozijo das almas que descobrem em tempo hábil o que é viver bem. Acreditar que a verdadeira felicidade não é deste mundo não deve abafar a busca por dias melhores. Miséria, sofrimento, doenças são desafios para nossa luta em prol da limpeza do Planeta. Enfrente seus medos e limitações, mergulhe fundo no que lhe incomoda e busque respostas com perguntas espertas e provocadoras. Não se contente com pouco. “É melhor ser alegre que ser triste. Alegria é a melhor coisa que existe”, diz a canção de Vinicius de Moraes e Baden Powell.

Assim, o seu epitáfio será escrito de outra forma, a história contada ao amigo que não se vê há muito tempo terá outra narrativa. Ajudar o próximo na tomada de consciência de que a vida é muito mais do que o que passa na televisão, do que é dito por aí, é tomar atitudes que resvalem de si para o mundo e contagiem positivamente outros tantos. Isso é cooperação, fraternidade, solidariedade. A melhoria espiritual e o progresso interior vêm quando paramos para analisar como tem sido a vida até aqui. E a prática é a marca indelével que deixamos como exemplo.

quarta-feira, 17 de março de 2010

A missão de cada um


O que significa missão? De acordo com o dicionário Houaiss pode ser encargo, obrigação, dever, incumbência. De modo mais abrangente, pode ser também oportunidade, compromisso, responsabilidade, escolha, desafio. Seja como for, missão tem a ver com uma tarefa proposta para alguém ou por alguém a ser realizada num determinado período. No caso da missão de cada um, isso só a própria pessoa poderá saber qual é a sua tarefa principal na vida.

De acordo com alguns estudiosos espíritas, missão está relegada a seres de elevado progresso espiritual como os Chicos, Xavier e de Assis, Jesus Cristo, Gandhi, Buda, Madre Teresa de Calcutá, Irmã Dulce, Bezerra de Menezes. Porém, como o vocabulário terreno é ainda muito limitado, por conta mesmo das nossas infinitas dificuldades em vários aspectos, o uso da palavra missão, tarefa, dever, incumbência pouco importa. O que mais vale é como cada um irá lidar com os seus projetos planejados ainda na pátria espiritual. Sim, porque todos nós temos um propósito que escolhemos de acordo com o nosso merecimento e adiantamento moral. Se não escolhemos, se acaso esse dever foi determinado amorosamente pela espiritualidade superior, é porque ainda merecíamos, naquele momento, uma ajuda para definirmos melhor nossos planos e podermos, assim, seguir com mais facilidade a trajetória aqui estipulada.

Foto: autoria desconhecida (Windows Vista)
E então, qual a missão de cada um? Quantos sabem dizer qual é a principal tarefa de sua jornada aqui na Terra? Será que viemos para sermos políticos honestos, educadores amorosos e responsáveis, médicos e enfermeiros atenciosos com a dor alheia, vizinhos respeitadores dos limites do outro? Ou será que estamos aqui para realizar grandes obras e feitos como JK – Jucelino Kubitschek? Quiçá teremos vindo para sermos simplesmente bons irmãos, pais cientes de seu papel, mesmo num ambiente caótico? O que temos pensado sobre a seara que viemos cultivar? Como temos preparado o terreno? Há seduções que nos desviam do caminho reto?

Muita gente deixa para refletir sobre esses temas mais profundos quando a dor surge nas suas vidas. Não tem sido assim? Mas o importante mesmo é que um dia a gente pare um instante e se perceba no mundo: o que é que eu estou fazendo aqui? Como é que eu estou vivendo? Qual o meu diferencial nisso tudo? Será que estou fazendo a diferença no mundo ou sou apenas “mais um”?

Certa feita, um entrevistado de Leda Nagle do programa Sem Censura (TV Brasil), contou que um menino de 16 anos o procurou para ser auxiliado por ele, um consultor, e assim definir qual curso escolheria no vestibular. O sábio especialista disse ao jovem: eu posso te ajudar sim, mas só poderei fazê-lo quando você me disser qual é a missão da sua vida.

Ora, alguém poderá dizer: “Mas esse jovem é quase ainda um menino, não viveu bastante para saber qual é a sua principal tarefa”. Bem, pode não ter ainda bem definida essa missão, mas já reúne condições suficientes para saber que caminho gostaria de trilhar, quais aspectos do mundo que o incomodam, quais as dores que o afligem. Um mergulho fundo nas nossas angústias pode nos levar a descobertas impressionantes sobre o que pensamos ou desejamos para o nosso universo particular assim como para a vida alheia. Uma breve análise sobre as nossas ações, pensamentos e sentimentos, pode nos trazer as respostas mais difíceis das perguntas da alma. Se eu sinto e vivo o bem, é porque o quero em mim e no outro, ou seja, quero que o bem se engendre nos diversos ambientes e indivíduos do mundo; se, ao contrário, eu vivo em ressentimento e planejando vinganças e duelos com o outro, é porque o meu interior está inundado de mal.

Não importa que profissão escolhemos, se estamos desempregados, se frequentamos esse ou aquele templo, se nossa tarefa é criar os filhos, cuidar da casa, preparar o alimento da família. O que importa é como realizamos essas tarefas, das mais simples às mais complexas. Realizamos com amor ou com enfado? Com alegria em servir ou com o murmurar das reclamações constantes em nossos lábios?

Se o véu do esquecimento nos impede de saber se a nossa missão está de acordo com o planejado no mundo espiritual, não usemos isso como desculpa para ficarmos passeando por aí. Elevemos nossos pensamentos e observemos como temos nos comportado. Como têm sido nossas atitudes? Que diferencial deixaremos no mundo? Seremos lembrados como alguém amoroso, compreensivo e um ser sempre aberto ao aprendizado? Ou, por acharmos que já sabemos tudo, como aquela pessoa arrogante, raivosa, triste, amarga e solitária? 


A missão de cada um pode ser, a cada dia, redescoberta, melhorada, ampliada para que mais pessoas recebam os respingos de nossa ação no mundo... Consulte a consciência e a intenção que há em cada palavra, em cada sentimento, em cada pensamento seu. Aí está a resposta para as inquietantes dúvidas acerca dessa pergunta que não quer calar: o que é que eu estou fazendo aqui? (Adriane Lorenzon)

Fonte: http://downloads.open4group.com

sexta-feira, 5 de março de 2010

Flores como se fosse primavera


Há dias tenho me detido a olhar, de modo mais atento, as flores. Aliás, as roseiras se tornaram, não por acaso, minhas preferidas.

Coisa de dois anos atrás, tenho tido evidências de que as rosas esbanjam mesmo é uma beleza irretocável... não só pela imagem exuberante que emitem aos olhos do olhador, mas pelo tímido perfume disfarçado entre as pétalas. Outras mais atrevidas ou despachadas mandam pro ar um perfume de deusas oníricas.

Em janeiro de 2010 tive a oportunidade de ir ao Fórum Social Mundial realizado, em parte, em Sapiranga (RS). Que maravilha descobrir a Cidade das Rosas! Lá, até o canal de esgoto é decorado (e não achei adjetivo melhor para elogiar!) com a flor vaidosa de O pequeno príncipe – e, nas mais variadas cores.

Foto: Adriane Lorenzon

Você pedala na ciclovia ao lado, com uma sensação de que está no jardim de casa. Tudo bem que não senti nenhum cheiro vindo do riozinho de dejetos. Aliás, nem havia sólidos, era uma água limpa, quase limpa. Mas vá lá, que a paisagem e até o ânimo melhoram ao se deparar com um espetáculo simples criado, provavelmente, por algum secretário municipal, prefeito ou morador que um dia ousou sonhar com uma cidade iluminada por rosas.





Foto: Adriane Lorenzon

As flores fazem qualquer caminho parecer menos fatigante. Uma trilha colorida com uma paleta diversa beirando o arco-íris se destaca num dos lugares mais nobres do ser: o timo, que fica pertinho do coração. Mas isso é papo para outro post.

Foto: Adriane Lorenzon

terça-feira, 2 de março de 2010

E agora, José?

Um dos poemas mais importantes da safra mais "visceral", digamos assim, do mineiro Carlos Drummond de Andrade, recitado por ele mesmo. Montagem da Creative Pixels.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Grande sertão: veredas








Para quem busca dicas de livros da nossa literatura, nada mal começar com a grande obra que Guimarães Rosa nos deixou: Grande sertão: veredas.


Guimarães Rosa, com seus gatos, uma de suas paixões, em 1944
Foto: autoria desconhecida - Google Images

Publicado em 1956 e escrito em primeira pessoa, o romance é a longa narrativa de Riobaldo, um vaqueiro que se torna jagunço. Falando com um interlocutor ausente - o próprio leitor? -, Riobaldo conta sua vida e sua paixão proibida por outro jagunço, Diadorim.


Tony Ramos e Bruna Lombardi - Ribaldo e Diadorim na tevê
Foto: Marcelo Prates - 1985

O autor se utiliza de palavras inventadas, expressões da linguagem popular e da erudita - uma recriação da língua portuguesa. A sugestão é que a obra seja lida em voz alta, assim o leitor tem a dimensão real do efeito dos diálogos e prosas dos personagens.

Vereda: buritis e um curso d'água, típicos do cerrado
Foto: autoria desconhecida - Google Images


Abaixo, alguns trechos curtos da obra:

"Viver é muito perigoso. Um sentir é o do sentente, mas outro é o do sentidor."


"Todo o caminho da gente é resvaloso. Mas, também, cair não prejudica demais."


"Sertão é o sozinho. Sertão: é dentro da gente."


"Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende."


E outros ainda:




"O sertão está em toda parte."

"Eu sou é eu mesmo. Divêrjo de todo mundo... Eu quase nada não sei. Mas desconfio de muita coisa."

"Sertão é onde manda quem é forte, com as astúcias."

"Perto de muita água tudo é feliz."

"Sertão é onde o pensamento da gente se forma mais forte que o poder do lugar."

"Eu me lembro das coisas antes delas acontecerem."


"O sertão é do tamanho do mundo."



Fonte:http://www.abccmm.org.br/jvmm/jv63/fotos/jv632.jpg


Para finalizar e inspirá-lo a ler, ou a não ler, diz-se que há dois tipos de leitor de Grande sertão: veredas: os que nunca leram e os que leem mais de uma vez.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Piedritas en la ventana

De vez en cuando la alegría
tira piedritas contra mi ventana
quiere avisarme que está ahí esperando
pero hoy me siento calmo
casi diria ecuánime
voy a guardar la angustia em su escondite
y luego a tenderme cara al techo
que es una posición gallarda y cómoda
para filtrar noticias y creerlas

quién sabe dónde quedan mis próximas huellas
ni cuándo mi historia va a ser computada
quién sabe qué consejos voy a inventar aún
y qué atajo allaré para no seguirlos

está bien no jugaré al desahucio
no tatuaré el recurdo con olvidos
mucho queda por decir y callar
y también quedan uvas para llenar la boca

está bien me doy por persuadido
que la alegría no tire más piedritas
abriré la ventana
abriré la ventana
(Mario Benedetti)