sexta-feira, 22 de junho de 2012

Amanhã, talvez


(Arte: R. Therien)

Na fila da lotérica de Palmitinho (RS), à minha frente, um cara com papo e jeito de educador físico brincava com uma dose de ironia com um rapazote magrelo: “Estamos lá na academia te esperando, quando decidir ir, aproveitar o que já pagou, apareça, mas sem pressa, viu, tranquilo”. Achei uma graça a broma. Essa bendita mania de adiarmos compromissos... Confesso que detesto pendências – dá um servição organizá-las.

Conheço gente que está de pé porque tem coisas malresolvidas em sua vida, é como se isso a deixasse animada o suficiente para viver. Iludidamente, claro. Entretanto, quando o adiado não nos prejudica, tudo bem. O lance é que pesa demais nos ombros postergar decisões sérias e o boleto vem, não tenha dúvida. Como diz a jornalista Rosana Braga: “Só deixe para amanhã aquilo que, se feito ou decidido hoje, puder ser ruim”. Resolver alivia o fardo. Acredite.

É possível que a mania de procrastinar faça parte da birra de nossa imaturidade psicológica. Muitas vezes isso fica escondido debaixo do tapete, no sótão da casa mental. Então, ao adiarmos novamente, nem nos damos conta que estamos empilhando conflitos que vão se fixando em lugares como a dor de cabeça, dos ombros ou pescoço, o cansaço que nunca cessa, a preguiça constante, aquele mau humor... A pessoa fica adiando ser feliz. Tolinha!

Como não nos habituamos a realizar leituras de nossas ações, vamos passeando até a véspera de entregar o dever da escola, preparar a reunião de amanhã, estudar para o concurso. Ou aguardamos a última gota cair no balde. Quando entornar, temos a desculpa da molhanceira e, então, vomitamos nosso desconforto com a situação. Ou, ainda, estudamos em demasia e concluímos: a prova nem fora tão difícil. Mas precisava passar por toda essa angústia?

Ainda criança, ao resmungar “depois eu faço” quando minha mãe me ordenava alguma tarefa, ouvia: “O depois fica, minha filha”. E fica mesmo. O postergar encontra mil motivos para adiar a finalização das responsabilidades. Desabafando com a professora Ana Santiago sobre a “moleza” de colegas que atrasavam a entrega de trabalhos, pois só estudavam, e eu com tanto mais a realizar respeitava o prazo, escutei: “Quem mais faz, mais arruma tempo”.

Imagine um locutor anunciando a música de Joana: “E agora, tocando no seu rádio, Amanhã, talvez”. Perfeita para nossa pauta. Segundo pesquisas na área de psicologia, cerca de 80 por cento das pessoas adiam os compromissos com certa frequência. Se confirmamos os dados? Observe o prazo final para entrega das declarações do Imposto de Renda. Muita gente deixa para enviá-la nos últimos minutos. E isso não é força de expressão.

Está certo, a vida contemporânea tem n tarefas que antigamente não existiam. Hoje, além do monte de roupa para lavar, temos os e-mails para responder e o Facebook nos cutucando, a aula de mandarim do filho, além de todo o acúmulo do que se “queria” ter dito, preparado, organizado. Contudo, culpar-se não é o melhor caminho. Mas, resolver hoje o que não deve ser deixado para amanhã dá uma sensação indescritível de se estar conferindo o check list da vida.

sexta-feira, 1 de junho de 2012

O hábito da excelência


A excelência na tela "Quarto em Arlens", 1888 (Vicent van Gogh)

Aristóteles dizia: “Nós somos aquilo que fazemos repetidamente. Excelência, então, não é um modo de agir, mas um hábito”. Ao ler essa pílula de sabedoria, quase tive um troço, pois ao decodificá-la, identifiquei, na hora, semelhança com o meu pensamento sobre o estar no mundo. E sentir-se acompanhado nessas grandes coisas da vida, dá um calorzinho na alma, principalmente quando tudo ao redor parece preferir a mediocridade...

Nesse sentido, buscar a excelência nos torna muito acima da média, embora isso não seja o mais importante. Aliás, é o que menos importa, pois não se trata de pequenas vaidades, apesar de ganharmos muito com isso. Quem sai beneficiado automaticamente são os outros: clientes, amigos, colegas, parentes. Saiba: tudo o que é repetido tem maior probabilidade de se perpetuar. Tudo o que é adiado é adiado. Simples questão de escolha.

Uma consequência certa de primarmos pela excelência é: muita gente preguiçosa e iludida vai torcer o nariz para você. Prepare-se para ouvir cochichos quando você passa ou para ser malquisto por familiares e conhecidos que juram que você está querendo aparecer. No entanto, os respingos desse esforço pelo melhor tocarão os que estejam prontos para iniciar suas empreitadas individuais rumo a um viver excelente.  

Se o processo está produzindo efeitos? Observe as pessoas com quem convive na intimidade. Aos poucos, e isso leva tempo, elas começarão a mudar também. Atente-se. E além do mais, haverá uma fase em que você não saberá dosar a medida dessa melhoria e o mundo ainda será atingido por um homem velho sendo lapidado. Siga em frente. A autoanálise é parceira quando se decide ser melhor como irmão, marido, esposa, colega, chefe, amigo, pai, mãe...  

Quer um exemplo? Imagine o ambiente de uma loja que aplica excelência no atendimento. Vai ter fila dobrando o quarteirão. Todo mundo vai querer comprar lá – porque o consumidor compra o conceito, o que está por trás do produto. Experimente no seu comércio. Em pouco tempo, o concorrente vai precisar mudar, vai querer saber por que ninguém mais entrou em sua venda. E, assim, toda a cidade será inspirada pelos bons ares da inovação.  

Mas para isso é necessário... co-ra-gem. Ah, essa dona que vive na tríplice fronteira do nosso querer, poder e fazer.  Há uma frase que gosto muito de Walter Kleinert: “Crianças têm medo da escuridão. Adultos têm medo da coragem”. Por que a coragem assusta? Sempre a mesma resposta, pode investigar: porque a zona de conforto é macia, segura, agradável, quentinha e, acima de tudo, exige pouco ou nada de esforço para continuar nela.

É inevitável. Comece pelos pensamentos, depois pelas palavras e, em seguida, pelas atitudes. Pode até realizar em outra ordem, desde que alcance um nível superior do último que você insiste em ficar agarrado por ser mais “legalzinho”. Legalzinho? Ser excelente é tratar a tudo e todos, inclusive você, de igual maneira nos quesitos fundamentais que a excelência exige. Descubra você mesmo quais são. Eu já achei os meus. Agora é que são elas. Cadê coragem? (Adriane Lorenzon)