sexta-feira, 20 de julho de 2012

A voz do coração


Arte: autoria desconhecida

Toda vez que preciso tomar uma decisão difícil, paro, escrevo os prós e contras, e lá no fim do esboço, acrescento o item “o que sinto”. Isso serve para eu exercitar o discernimento, sem deixar de ouvir a voz interior. Ou seja, reflito sobre o tema com minha racionalidade, porém considero o que fala o sentimento, a intuição, o que alguns denominam sexto sentido. Dessa forma, tenho domínio sobre a decisão a ser tomada e evito autovitimizações.

Seguir o coração ou a intuição, que na prática dá no mesmo, não é tarefa simples. Exige coragem e, principalmente, autoconhecimento para escutar o que está falando alto no fundinho da gente. Para tanto, é preciso silenciar. Foi o que aconteceu comigo em 1996, depois de um curso realizado na Universidade de Brasília. De volta a minha cidade no Sul do país, dentro de mim, uma voz, imperativa, mandava: “Saia do Rio Grande do Sul”.

Lembro-me que foi a primeira vez que ouvi a intuição de modo tão expressivo. Não sabia direito do que se tratava. Além do mais, não costumava viajar, não tinha um emprego me esperando em outro lugar, mas era certo que precisava “voar as tranças”. Decidi pegar um ônibus a Palmas no Tocantins. Contudo, parei em Brasília para um passeio. E fiquei. Consegui trabalho em três dias na capital federal – ela é bem generosa...

Depois, amadureci a relação com a intuição que já não me parecia uma estrangeira. Eu sabia exatamente a diferença de um pensamento da mente racional, digamos assim, e do que vinha acompanhado de intuições, que está num locus transcendente. Hoje, parece-me tudo tão óbvio. Todavia, precisei ser avisada pela intuição, porque se fosse só por conta própria, podia pegar outros rumos, outras veredas.

Um dia, chorei horrores. Sem motivo aparente, não conseguia parar. Meu namorado e suas duas filhas tentavam me consolar, e eu, aos borbotões. Queriam saber o que se passava para tentarem me ajudar. Entre soluços, disse: “Não sei, sinto que algo muito grande está para acontecer”. Podia ser bom ou ruim; entretanto, mudaria a minha vida para todo o sempre, e adormeci com essa certeza.

Após algum tempo, na luta com o câncer de minha mãe e todo o nosso envolvimento (pois ficamos muito unidas), entendi tudo. Viver ao lado dela nos últimos 13 meses de sua vida na Terra foi a coisa mais linda, extraordinária, fantástica, excepcional da minha vida. Embora extremamente doloroso. A intuição me cercou de orientações anos antes, como que me dizendo: “Te prepara”. E passei, de fato, me preparando para viver meu grande amor.

A amiga Andrea Barros, em nossa primeira juventude, antecipou: “Quando encontrares teu grande amor, Adri, vais perceber que ele esteve sempre ali, ao teu lado”. Batata! Enfim, a intuição é isto: auscultar o silêncio diante do barulho da vida material. É encontrar a luz do fim do túnel desde seu início. Para saber se é intuição de verdade, observe: ela é incontestável, certeira, inevitável. (Adriane Lorenzon)

sexta-feira, 6 de julho de 2012

O que é o amor?


(Foto: autoria desconhecida)

Esqueça o que você acha que é o amor, ou o que lhe disseram sobre. Atrás da petulância, mostro-me sem tanta competência para afirmar o que ele é. A propósito, figuras nobilíssimas receitam, há milênios, o modo de usá-lo. Aprendi com elas: amar é sentir e vivenciar o amor universal, sem condições e intolerâncias. Caso contrário, o que se espalha por aí é qualquer outra coisa: apego, obsessão, carência, atração física, confusão; tudo, menos amor.

Danilo Caymmi e Dudu Falcão criaram uma das letras mais poéticas de nosso cancioneiro: “O que é o amor, onde vai dar, parece não ter fim, uma canção cheirando a mar, que bate forte em mim”. O alagoano Djavan é certeiro: “O amor é como um raio galopando em desafio”. Inúmeros poetas tentaram decifrar o enigma do sentimento que está no topo da lista das virtudes humanas. Camões foi categórico: “É um andar solitário entre a gente”.

Alberto Caeiro, heterônimo do poeta português Fernando Pessoa, falava de como o amor nos transforma, pois enxergamos as mesmas coisas com um olhar diverso: “Vejo melhor os rios”.  Diferente do compatriota, relata em Pastor amoroso: “O amor é uma companhia. Já não sei andar só pelos caminhos, porque já não posso andar só”. O poeta conclui: “Antigamente acordava sem sensação nenhuma; acordava”. Com o amor, tudo muda, sugere Caeiro.

Se a poesia nos salva, como bem alertou um poeta, o amor liberta: uma ideia transcendental. Ao compreender isso, nossa mente é impedida de voltar ao tamanho anterior. É aí que permitimos que o amor exista e nos invada e nos impulsione para patamares nunca dantes alcançados. O amor está ali, tão perto, mas carece de nossa decisão para nos juntarmos a ele, como a gota que, ao se unir ao todo, muda de nome e passa a se chamar oceano.

Para mim, o maior exemplo de amor é Jesus Cristo – e outros seguidores de seu modelo de mansuetude, compreensão, fraternidade, como Francisco de Assis. Aquele, O cara, com todo o respeito, dizia que o amor é a caridade e que fora dela, cadê salvação? Amigo leitor, o que é a caridade senão o amor incondicional? Ela faz nossa vida ser menos amarga. Amor, segundo JC, é abnegação, devotamento, compaixão. Saca?

Francisco de Assis, praticante do desapego aos bens materiais, é referência para o mundo quando se fala de amor. Na Oração de São Francisco, uma inspiração: para amar de verdade é preciso coragem. “Onde houver ódio que eu leve o amor; na ofensa, o perdão; na discórdia, a união; no desespero, a esperança. (...) Que eu procure mais compreender que ser compreendido, amar que ser amado, perdoar que ser perdoado.”

Paulo de Tarso, Gandhi, Buda, Sócrates, Irmã Dulce, Chico Xavier, todos, de alguma maneira, nos soprando ao ouvido: em vez de julgar, coloque-se no lugar do outro; faça ao próximo o que gostaria que lhe fosse feito; mantenha o ânimo apesar das adversidades; afaste-se para debaixo de uma árvore para revisar o que precisa melhorar em sua vida. Camões, na voz de Renato Russo, entoa: “É só o amor que conhece o que é a verdade”. (Adriane Lorenzon)