sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Posse responsável

Meu namoro com os cães é de pouco tempo atrás e nasceu bem devagarinho, sem forçar a amizade. Assim como eu faço com os gatos, deixei a coisa acontecer. Está certo que alguns cachorros não querem nem saber e vão logo lambendo, pulando, sujando ou puxando fio da roupa da gente. Mesmo assim, foi surgindo um amor diferente por Canis lupus familiaris que eu não esperava. Afinal, sempre fui uma gateira confessa.

Os verões já não são os mesmos. Sempre há um cachorro perdido que eu não resisto em parar para conversar, dar atenção e carinho. Faz um bem danado para as almas dos dois seres ali em comunhão. E isso tem ocorrido com certa frequência em Florianópolis, na medida em que minhas temporadas de férias têm sido na ilha de Santa Catarina.

Num desses veraneios percebi que havia um grande número de cachorros soltos pela praia – sem acompanhamento de mão humana. De mais a mais, não eram cães sarnentos, magrinhos, desnutridos, velhos. O que para algumas mentes sórdidas poderia justificar o abandono. Tratava-se de bichos de raça, ou mesmo vira-latas, mas todos com aspecto físico saudável.

Comecei então a investigar, a perguntar aos nativos o porquê desses animais estarem sozinhos, perdidos. Aliás, os pobrezinhos corriam de um lado a outro, tontos de tanto procurar um não sei quê de dono, qualquer rosto conhecido. Como resposta, descobri que muitos turistas presenteiam sua prole com filhotes caninos. Só que esses fofuchos crescem e se tornam um incômodo para famílias sem noção de posse responsável. E porque já são grandes, ocupam mais espaço e fazem mais bagunça do que se esperava. No verão seguinte, são deixados soltos, vagando pelas praias. Não é assim com tartaruguinhas compradas para compor aquários? Um dia crescem e já não cabem mais nos pequenos caprichos de vidro.  

Os maus-tratos especificamente a cachorros não são privilégio no Sul do país. Lembro-me de um feriadão em Búzios que junto a amigos fui a uma praia linda, dessas de cartão-postal, de mar azul, azul. Com céu nublado, vento e sem muito calor, pouca gente se animou em sair de casa. Minha porção generosa de observação detectou ao longe um pequeno cachorro que corria do mar em direção à areia, repetidamente. Aquilo me incomodou. Resolvi assuntar.

Aproximei-me devagar para ganhar tempo, verificar o que de fato ocorria e, se preciso fosse, inventar algo para salvar o animalzinho. Um homem e umas três crianças “brincavam” de levar um poodle para dentro do mar. Quando o soltavam, em meio a um quase afogamento, tremendo de frio, corria para longe do cenário de tortura. Pensei, pensei, pensei. Meu Deus, preciso fazer alguma coisa! Como havia uma mulher fora da água e parecia ser a mãe dessas crianças, concluí que ela poderia ser meu canal de acesso ao cão. Apelei para os sentimentos femininos.

Não deu outra. Bingo! Respirei fundo e com a maior cara de pau inventei um personagem de médica-veterinária. Disse-lhe que o poodle poderia pegar uma pneumonia ou mesmo vir a óbito se a prática continuasse. [Perdoem-me os veterinários, foi o que me ocorreu no momento!] Confessou-me que já havia pedido mas a família não a escutara. Então sugeri que tornasse a falar – eu estaria por perto para qualquer necessidade. E fui andando de volta. De repente, olhei para trás e minha alegria e alívio foram imediatos. Vi a família saindo da praia com o cachorrinho enrolado numa toalha. Pensei: valeu o dia!

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