sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Salve, amizade!


(Arte: autoria desconhecida)

É no período de eleições que se observa como a amizade é forte, aguerrida e brava. As conhecidas e comuns barganhas nos levam a constatar o ditado: “Para os meus, tudo. Para os outros, nada”. Em pequenas localidades fica mais evidente porque todo mundo se conhece, as cores ficam mais coloridas. Brigas e ofensas defendem o sicrano que é mais honesto, mais competente, mais preparado, mais o quê, mesmo?

Num passeio, ouvi uma conversa de arrepiar. Uma pessoa gostaria de ir até um amigo que havia passado por uma enfermidade e estava em recuperação. Obtemperou que não poderia fazê-lo por conta da campanha eleitoral. Se fosse agora, o companheiro pensaria que o intento serviria para angariar votos para o partido do visitante. Contudo, segundo este, a iniciativa era motivada “só” pelo bem-querer.

Passaram-se dias, assuntei uma prosa parecida. Meu pai queria visitar alguém (sem intenção eleitoreira), mas se realizasse a cortesia, o carinho seria interpretado como interesse político. É como se, em tempos eleitorais, um decreto ou uma sentença imaginária fossem determinantes: visitas cordiais não existem; o anfitrião pensará, indubitavelmente, que o encontro tem motivos diversos da pura e fraterna parceria.

Há décadas observo relações sendo desfeitas por conta de partidos políticos. Gente que hoje está numa sigla, daqui a quatro anos em outra e, em igual medida, a camaradagem vai se deteriorando. Até membros de uma família tornam-se inimigos e demoram a voltar a se falar (ou nunca mais se quadram) por conta de agremiações partidárias. Na minha cidade natal isso é comum. Na sua, idem.

No Brasil, funcionários privados e servidores públicos são obrigados a saírem, durante ou fora do expediente, para trabalhar por um candidato. Alguns vão por conta própria. Como provar, perguntei a uma amiga que me contou um fato. “É complicado, pois ninguém quer se expor ou perder o emprego”, afirmou. Teria de montar, quem sabe, uma espécie de tocaia usando câmera e microfone escondidos para o flagrante? E os bacharéis concluiriam com riso de obviedade nos lábios: “É o ônus da prova”.

Tem ainda os cargos que são prometidos antes do pleito. Se você votar em mim e fizer campanha pelo meu nome, a secretaria disso ou coordenadoria daquilo já é sua. Ai, ai, ai, ai, ai. Depois, em janeiro, nos esforçamos para entender, em vão, por que o fulano, incompetente e boçal, é o escolhido para tal posto. Dá uma dorzinha de cabeça no começo, todavia, o povo se acostuma... Afinal, é assim há séculos... Será?

De que adianta sabermos dessas coisas, se temos de apresentar as provas? A não ser que tomemos o Ministério Público como aliado e ajudemos a limpar uma minúscula parte da sociedade. Quem se habilita a denunciar? Porque na hora H, o fulaninho considerado vítima não tem suporte e coragem suficientes de encarar o fardo e, irá fugir da raia – tadinho, foi ameaçado de demissão!  Em época de promessas e discursos políticos fico emocionada. Realmente, amizade é coisa séria. (Adriane Lorenzon)

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