(Arte: autoria desconhecida)
É no período de eleições que se observa como a amizade é
forte, aguerrida e brava. As conhecidas e comuns barganhas nos levam a constatar
o ditado: “Para os meus, tudo. Para os outros, nada”. Em pequenas localidades fica
mais evidente porque todo mundo se conhece, as cores ficam mais coloridas. Brigas
e ofensas defendem o sicrano que é mais honesto, mais competente, mais preparado,
mais o quê, mesmo?
Num passeio, ouvi uma conversa de arrepiar. Uma pessoa gostaria
de ir até um amigo que havia passado por uma enfermidade e estava em recuperação.
Obtemperou que não poderia fazê-lo por conta da campanha eleitoral. Se fosse agora,
o companheiro pensaria que o intento serviria para angariar votos para o
partido do visitante. Contudo, segundo este, a iniciativa era motivada “só” pelo
bem-querer.
Passaram-se dias, assuntei uma prosa parecida. Meu pai queria
visitar alguém (sem intenção eleitoreira), mas se realizasse a cortesia, o
carinho seria interpretado como interesse político. É como se, em tempos eleitorais,
um decreto ou uma sentença imaginária fossem determinantes: visitas cordiais
não existem; o anfitrião pensará, indubitavelmente, que o encontro tem motivos diversos
da pura e fraterna parceria.
Há décadas observo relações sendo desfeitas
por conta de partidos políticos. Gente que hoje está numa sigla, daqui a quatro
anos em outra e, em igual medida, a camaradagem vai se deteriorando. Até
membros de uma família tornam-se inimigos e demoram a voltar a se falar (ou
nunca mais se quadram) por conta de agremiações partidárias. Na minha cidade
natal isso é comum. Na sua, idem.
No Brasil, funcionários privados e servidores públicos são
obrigados a saírem, durante ou fora do expediente, para trabalhar por um candidato.
Alguns vão por conta própria. Como provar, perguntei a uma amiga que me contou
um fato. “É complicado, pois ninguém quer se expor ou perder o emprego”,
afirmou. Teria de montar, quem sabe, uma espécie de tocaia usando câmera e
microfone escondidos para o flagrante? E os bacharéis concluiriam com riso de
obviedade nos lábios: “É o ônus da prova”.
Tem ainda os cargos que são prometidos antes do pleito. Se
você votar em mim e fizer campanha pelo meu nome, a secretaria disso ou
coordenadoria daquilo já é sua. Ai, ai, ai, ai, ai. Depois, em janeiro, nos esforçamos
para entender, em vão, por que o fulano, incompetente e boçal, é o escolhido
para tal posto. Dá uma dorzinha de cabeça no começo, todavia, o povo se acostuma...
Afinal, é assim há séculos... Será?
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