sexta-feira, 29 de abril de 2011

Das drogas e outros choques sociais

(Arte:  Valdir Oliveira Design, 2005)

Acompanhei, nos dias 19 e 20 de abril, via Facebook, o compartilhamento de entrevista da jornalista Leilane Neubarth (Globo News) com a professora Gilberta Acselrad (UERJ). Os amigos da rede social questionavam a atitude da apresentadora pois, segundo eles, a mesma ao se surpreender com a resposta da interlocutora, não teve, grosso modo, jogo de cintura para “segurar” a entrevista. Todos, de modo geral, queriam saber quando a temática das drogas seria finalmente discutida abertamente.

Polêmicas à parte, não estou aqui para defender ou acusar. Não sou advogado nem promotor. Em tempo: “abertamente” seria tratar da legalização ou descriminalização das drogas, hoje ilícitas, no Brasil, permitindo a cada um agir de acordo com sua vontade, o tão propalado livre arbítrio. Ai, ai, ai, ai, ai. O que fazer? Trata-se de uma questão muito delicada. Calma, muita calma nessa hora! Raciocinemos, não se diga mais, raciocinemos!

A pauta: pesquisa da Secretaria Nacional Antidrogas com 18 mil universitários brasileiros aponta que 49% deles já experimentaram algum tipo de substância ilícita. Percebe-se, no início do programa, a clara diferença de intenções: prevenção à dependência química e aos decorrentes males do uso de drogas, e, análise do papel equivocado do Estado nas políticas públicas da área, além de afirmações nonsenses.

O problema, conforme a entrevistada, não é o “uso das drogas” mas a “perseguição às drogas”. Ela defende a legalização de substâncias como maconha e cocaína. Pesquisadora do assunto, ao ser perguntada sobre como prevenir a dependência de jovens a essas doses cada vez mais comuns nesse grupo, respondeu: “Prevenção significa evitar que alguma coisa aconteça. Então você pode evitar a tuberculose com uma vacina (...) mas as drogas não são uma doença”. São o quê, então, cara-pálida? Um brinquedinho?

Primeiro, no Youtube a professora é chamada de... educadora [?] e de acordo com texto extraído da Internet ela é mestra em educação. Ora, educador foi Paulo Freire – entendia, na prática, do “ser no mundo”. Segundo, o argumento da senhora representante acadêmica afirma: “Nenhuma droga por si só é perigosa”. [Por favor!] Terceiro, se livre arbítrio significasse fazer escolhas, acertadas, de preferência, todos os dependentes químicos (de maconha, crack, álcool, oxi, anfetaminas...) teriam experimentado as drogas e se libertado delas no menor sinal de perigo [porque ele vem, ah vem!]. Tentar dezenas de vezes deixar de fumar e não conseguir não é curtição. Isso é vício, e vício é doença.

Não é de hoje que um veículo de comunicação deve apresentar programas ou mesmo comerciais publicitários em horários específicos e coerentes com a população-alvo. Qualquer debate mais acalorado em sociedade deve seguir esse critério básico. E a respeito da legalização das drogas não se dá, certamente, num primeiro momento, numa produção de sete minutos, às seis da tarde, fora de contexto. Temas como esse carecem de uma justificativa apurada para definir o público, horário e qual patamar de discernimento social se quer atingir.

Um jovem de 15 anos com sérios conflitos familiares, sem uma escola plural e libertadora para auxiliá-lo na caminhada, sem amor e acolhimento, não será influenciado a usar drogas ao ouvir argumentos pela legalização sem a devida justificativa? Daí a importância do esclarecimento ocorrer num ambiente dialógico, com a participação de estudiosos da medicina mostrando imagens e relatos dos efeitos dessas substâncias no organismo humano, de dependentes químicos relatando suas realidades, de cidadãos afetados diretamente pela ação da droga. Enfim, com quem domina a questão.

A propósito, uma coisa é a discussão em nível teórico e ideológico. Outra, neste caso, bem diferente, é o debate em nível prático: mãe que denuncia filho pelo envolvimento do pequeno rebento com o tráfico depois de o mesmo vender tudo dentro de casa; dependente de crack que vê seus dentes perfurados, o corpo definhando e a morte o espreitando; jornalista com noção do seu papel social no veículo em que atua. Enfim. Reflitamos. Enquanto a ciência insistir em não enxergar outros aspectos que envolvem o ser no mundo, voltaremos a vãs discussões.

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