quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Passado presente

Capa de CD produzido pela rádio Eldorado (foto: autoria desconhecida)

Primeiro, eu não achava nada. As aulas de história eram sempre sobre a história dos outros – de um bando de gente que eu não conhecia, que até já tinha morrido. Então, eu tinha mais é que decorar aquele monte de coisa que acontecia no mundo – que não era meu éthos, do original grego, que não era minha casa – para passar nas provas bimestrais e no terrível exame final. E passava, porque se dispensava a reflexão.

Depois, muito tempo depois, descobri que havia uma relação entre mim e todos os outros habitantes dessa bolinha azul de sete bilhões de criaturas – diferentes e conexas. Descobri que esses indivíduos eram parte da mesma casa, que é a Terra. E aí passei a me interessar. Simples assim. Aliás, se rolava conexão, havia interesse em mim. O outro e o eu eram parte integrante de uma mesma orquestra sinfônica.

Nessas aulas da infância, o dia 13 de maio era apenas o Dia da Abolição da Escravatura no Brasil. A bambambã heroína era a princesa Isabel. E os milhares de irmãos que haviam sido escravizados, desrespeitados, subjugados, humilhados, mortos, retirados à força de sua própria vida com o ódio atávico nos olhos do capataz e do senhor do açoite, esses pareciam coadjuvantes de uma grande ópera trágica dos palcos.

Agora, procurando por datas comemorativas ou que prestam homenagens, descubro que a Unesco criou, em 1997, o dia 23 de agosto como Dia Internacional da Lembrança do Tráfico de Escravos e sua Abolição. E já com algum lastro experiencial sobre o valor e o respeito do outro, que é também eu, relaciono o porquê da importância de entender o passado e reflexionar sobre os fatos que nos antecederam historicamente.

Quando conhecemos o pretérito e fazemos as devidas ligações com a atualidade, conseguimos compreender temas polêmicos como a reforma agrária, as cotas sociais em universidades e a devolução de terras indígenas aos verdadeiros proprietários – ainda que isso fira interesses particulares de gente de bem, bem-estabelecida na vida. Revisitar o passado, sim; não para sofrer de novo o sofrido, mas para não deixar nunca mais que a ganância e o desamor de uns se fortaleça e se imponha em todos. (Adriane Lorenzon)

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