Em turma, adolescentes relaxam. Ufa! (Foto: autoria desconhecida)
Samara
é uma garota de 14 anos. Trabalha no viveiro de flores da família à beira de
uma estrada do Brasil. Samara é bonita, simpática, exímia vendedora, comunicativa
e, em especial, entusiasmada. Completamente distinta da maioria dos
adolescentes de sua idade – muitos são desanimados, mal-humorados, preguiçosos,
reclamentos. Quando a conheci, me surpreendi tamanha a diferença evidente em
seus olhos, gestos e passos.
Fiz
questão de elogiá-la ao pai dela, caso não a valorize tanto. E a ela, se um dia,
no futuro, ao trilhar uma carreira profissional, se esqueça do quanto esse
momento de responsabilidade sendo talhada nas horas em que gostaria de estar
conversando com as amigas é importante para o seu amadurecimento, ou, ainda, como
quer o mercado, para turbinar o currículo. Detalhe: Samara parece realmente
feliz com o que faz. É disposta, saca?
Samara
é única porque não me cansou. Adolescentes, hoje, público que sempre me dei
bem, me causam preguiça. Não gostam de quase nada que lhes é oferecido: comida,
presentes, sugestão. Querem levar a vida na flauta, na maior facilidade.
Estudar é coisa para CDF, trabalho para pobre. Percebe que adolescentes de
classes sociais diversas parecem ter nascido em berço esplêndido? Estariam com
a vida ganha? E os pais reforçam tal comportamento...
Samara é ímpar? É. Quem decide
ser diferente da maioria impulsiona a grande roda de descobertas ao longo do
desenvolvimento do mundo. São aqueles que querem algo mais, não se contentam
com o mínimo, buscam sempre inovar, criar, produzir. Não falo de ideias desatinadas.
E, sim, de atitude, de vislumbrar um rumo e segui-lo, de arregaçar as mangas.
Isso não é exploração ou desrespeito ao ECA; isso é o que constrói seres
inteiros.
Nesse
ínterim, no desfiladeiro de elogios e aplausos pisca o sinal amarelo. Para adolescentes
e crianças, almejar um patamar superior sem esforço é “habitual”, afirma
Contardo Calligaris. Um dos psicanalistas mais badalados da atualidade é
acusado por muitos pais de estragar os sonhos e o futuro de tão brilhantes e
fantásticas criaturas. Genitores babam pelas grandes promessas de sucesso,
iludindo-se que o mundo se curvará aos pés dos pimpolhos.
No
texto Epidemia de amor pelas crianças,
Calligaris explica que “os elogios incondicionais dos adultos aos filhos não
produzem autoconfiança, mas uma dependência”. Depois, passarão a vida se
esforçando para ouvir aplausos e não para alcançar o que desejam. O autor
sugere “uma mudança preliminar na maneira de contabilizar as falhas que podem
atrapalhar a vida de nossos rebentos”. Aliás, falhas e fracassos são
inevitáveis no meu caminho, no seu, no deles.
No
Facebook, uma campanha pede: “Pais, digam não
aos seus filhos, pelo bem da humanidade”. Não precisamos voltar ao passado,
torná-los invisíveis, sem valor. Talvez, um pouco mais de firmeza, diálogo, e exigir
contrapartidas responsáveis e educativas, como lavar a louça, espanar o pó dos
livros – e se tem livro em casa, há incentivo pela autonomia e engrandecimento
do ser. Logo teremos formado legiões de pessoas amorosas, responsáveis, respeitosas,
e, consequentemente, construtoras de um mundo bem melhor. (Adriane Lorenzon)
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